quarta-feira, dezembro 13, 2006

Elas... (2)

Existem álbuns que parecem trazer consigo todo o encanto perdido de uma cultura. Obras que conseguem a proeza de rejuvenescer géneros aparentemente esmorecidos a nível criativo, com toda a solenidade que se exige. Exemplo disso são “5:55” de Charlotte Gainsbourg, “A Primitive Guide To... Being There” de Jhelisa e “Springtime Can Kill You” de Jolie Holland; escreva-se então sobre eles...

“A Primitive Guide To... Being There” by Jhelisa.

(2006 / Infracom!)

Jhelisa consegue numa assentada revolver as raízes da música afro-americana e criar um prodigiosos álbum gospel, primoroso em melodias delicadas acompanhadas por arranjos vocais extraordinários. Espantoso, a nível melódico (no seu todo), é justamente a proeza de se ter obtido um sofisticado resultado final sem nunca se perder de vista as tradições que estiveram na sua origem. Começou por ser gravado em Nova Orleães, no entanto um fenómeno designado Katrina, não permitiu que as gravações fossem aí terminadas. Como consequência do sucedido, Jhelisa acaba ainda por reflectir na obra a necessidade da recriação de uma integridade comunitária numa cidade que luta para ir de encontro à áurea alegre que a caracterizava... Uma obra humana sobre humanidade. (9/10)

“5:55” by Charlotte Gainsbourg.

(2006 / Because Music)

Em “5:55” encena-se o imaginário de uma cultura francesa tal como esta tem chegado ao resto do mundo nas últimas décadas. Uma cultura que tem na música como responsáveis nomes como os de Air, que por sua vez têm como fonte de inspiração o incontornável ícone do país que é Serge Gainsbourg - culpado pela disseminação de um charme bandido, a emanar fetiches sexuais por tudo quanto é poros num ambiente onde o álcool é fundamental e o fumo de cigarros paira no ar. É justamente nesse meio que a filha do principal responsável da criação desse imaginário vai ao encontro dos que nele se inspiram para espalhar a sua sensualidade. A sua voz combina bem com a música dos Air, deixando assim que eles fantasiem com ela enquanto languidamente trata de os deixar extasiados com as suas interpretações. (8,5/10)

“Springtime Can Kill You” by Jolie Holland.

(2006 / Anti-)

E eis que, finalmente, Jolie Holland faz aquilo que tem vindo a ameaçar fazer e que tinha ficado aquém em disco anteriores: um álbum maior. “Springtime Can Kill You” é o seu melhor álbum e é belo. Uma obra que ajuda a definir um espaço como pertencente cada vez mais à artista em causa, independentemente do facto de trazer para a ribalta toda a nostalgia de uma cultura musical americana de um inicio do passado século para adejar harmoniosamente no universo da obra. Essa nostalgia é aqui utilizada mais como um meio do que - ao contrário dos discos anteriores de Jolie Holland -, um fim a atingir. (9/10)