terça-feira, janeiro 23, 2007

Reedições (2)

"It’s So Hard To Tell Who’s Going To Love You The Best" by Karen Dalton.
(2006 / megaphone)

O ano de 2006 não contou apenas com a reedição de “In My Own Time” de Karen Dalton, também foi reeditado uma outra obra sublime, que data originalmente de 1969, da qual agora se escreve e que tem um título que a define tão bem: “It’s So Hard To Tell Who’s Going To Love You The Best”. Aqui deparamo-nos com Dalton assombrada pelos seus fantasmas a assombrar o ouvinte com os seus magníficos blues. Ouvimo-la de forma cúmplice, pois desta vez encontramo-la entregue apenas à sua guitarra ou ao seu banjo, a definir uma entidade feminina de referência no meio... aqui temos blues a sério. A história da música parece no entanto ter passado bem sem ela – erro crasso esse -, por muito que músicos de calibre chamam-se a atenção para Dalton. Nick Cave ou Devendra Banhart tecem-lhe elogios; por outro lado, podemos encontra-la em fotografias com uma figura como Bob Dylan; este que a defende como sendo a sua cantora preferida. Existem razões para tal alarido e grande parte delas podem ser encontradas neste disco. Que o erro, depois da sua morte, seja então corrigido. (9,5/10)

quarta-feira, janeiro 17, 2007

Reedições (1)

"In My Own Time" by Karen Dalton.
(2006 / Light in the Attic)

Torcesse o nariz quando se ouve a versão soul de “When a man loves a woman”, e tudo que se pode dizer para acusar esta obra de possivel desinteresse está dito. Também não interessa, em seguida ouve-se “In My Own Dream” e depois “Katie Cruel” e já não há volta a dar atrás. Deixamo-nos transportar no tempo, para uma época que não é esta – até porque o disco foi lançado originalmente em 1971 – e aí ficamos a pairar deliciados nesta música de enorme afectividade a blues, folk, country e soul. Vai-se ouvindo cantar o amor, como se quer que se cante; a melancolia, com a nostalgia requerida e a opressão com toda a contenção necessária; de uma voz extraordinária com uma sensibilidade marcante. E depois é a vez de dar o veredicto final, e “One Night Of Love” dita definitivamente: este é um álbum superior. Podia ser Billie Holiday, mas não é... é alguém com a mesma profundidade e talento – pasme-se. (9/10)

terça-feira, janeiro 16, 2007

Híbridos (3)

"Happy New Year" by Oneida.
(2006 / jagjaguwar)

Dada a sua irregularidade sonora, “Happy New Year” foi um daqueles álbuns que se estranhou nas primeiras audições que se fizeram dele. No entanto voltou-se (voltasse) a ele com bastante frequência, visto que havia sempre uma ou outra canção que fazia sentido ouvir em determinado momento; e pelas partes ouvidas em separado ganhou-se assim a consciência de um todo que pode adquirir justamente a sua lógica desta forma. O disco anterior de Oneida, “The Wedding” - igualmente magnífico -, também era desafiante nesse aspecto, se bem que agora está bem mais acentuado. Pode-se fazer uma comparação directa ao método criativo de Primal Scream, no corrosivo “Evil Heat”, se quisermos; mas também a Soft Machine. Ou seja, leva-se o mais longe possível os elementos da música que inspira estes grupos, criando um rock praticamente disfuncional, que sorve ainda vários elementos estranhos ao seu meio; mas que mesmo assim, em territórios inóspitos, consegue revelar as suas virtudes. Um estilo destes, ainda não está classificado de todo, no entanto consegue ser belo, e Oneida provam justamente isso com este excelente disco. (9,5/10)

sábado, janeiro 13, 2007

Híbridos (2)

“YoYoYoYoYo” by Spank Rock.
(2006 / Big Dada)

Aqui temos um exemplo concreto da capacidade que o hip-hop tem para sofrer metamorfoses e se reinventar; no entanto, desta vez a transformação foi tal, que “YoYoYoYoYo”, o disco de estreia de Spank Rock, tem de ser colocado à margem de um qualquer estilo já definido. De facto não será correcto de todo classificar esta obra do duo vindo de Baltimore e NYC, pois não se sabe em concreto o que uma música que assimila influências do hip-hop, house, tecno, electro, grime ou tecno, é.... Neste caso sente-se que não existe a necessidade de se criarem barreiras para a construção de uma linguagem própria, por excelência física e pujante; por isso esta é uma música de impulsos e sem preconceitos... música que merece, e deve, ser ouvida. (9/10)

Híbridos (1)

Não se sabe bem o que são, se isto, aquilo, tudo ou nada disso... Essa característica torna-os justamente tão desafiantes, e nos casos em questão, irresistivelmente estimulantes. Quem está em questão são as descaradas Cansei de Ser Sexy (magnífico nome, este), os melómanos Oneida e os impulsivos Spank Rock. Admiráveis casos de vitalidade artística do ano de 2006. Para já, escreve-se sobre Cansei de Ser Sexy.

"Cansei de Ser Sexy" by Cansei de Ser Sexy.
(2006 / Sub Pop)

É impossível não se ficar bem disposto com o álbum homónimo das Cansei de Ser Sexy, colectivo vindo de São Paulo. Aquilo que está representando no disco não será propriamente a cultura do país de onde são originais, será antes uma mescla de diferentes correntes musicais urbanas da Pop mais imediata (sobretudo da nipónica) a colapsarem com uma abordagem Indie de criação musical num caldeirão de humor insolente que torna este disco irresistível. Vêm à memória LCD Soundsystem, Hole, Peaches, Daft Punk, Le Tigre; assim como, sem perder credibilidade, casos aberrantes da Pop que tinham justamente a pretensão de criar música como a que se ouve neste disco - como que, se as “Sailor Moon” irrompessem num filme de Hayao Miyazaki. E é de facto de louvar que nada disso é dissimulado, sendo apenas apresentado com a maior das simplicidades, por isso merecem todo o mérito por conseguirem tal habilidade. (8,5/10)

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Electrónicas (7)

“An Announcement To Answer” by Quantic.
(2006 / Ubiquity)

O quarto registo de Quantic conta com uma estratégia interessante a nível musical, própria de marca de autor que se afirma enquanto tal. “An Announcement To Answer” é aliás, a consagração disso para Will Holland, o nome por detrás do projecto. Recorrendo a influências orientais, balcânicas e porto-riquenhas, conjugadas com uma sensibilidade de apelo à pista de dança – o que consequentemente traz também para a amalgama correntes de inspiração urbana – o todo que daí nasce é um triunfo estético que distingue Holland como sendo cada vez menos um seguidor de correntes para se afirmar enquanto referência. Não ficará muito longe de um estilo – aqui cinematográfico – de Wong Kar-Wai, porém com uma necessidade de movimento corporal mais ritmado, pois esta sonoridade é por excelência criada para que a sua audição se possa traduzir nisso, mas que está longe de impedir a sua contemplação num sofá confortável. E dito isto, resta dizer que, portanto, temos autor. (9/10)

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Electrónicas (6)

“Post Industrial Trauma” by Post Industrial Boys.
(2006 / max.ernst)

Não é mais um albúm elegante, é um albúm elegante – como não se ouve muitas vezes -, aquele que os Post Industrial Boys deram a conhecer em 2006. Para se tirarem as dúvidas oiça-se logo à partida algo reconhecível: a magnífica versão de “Take A Walk On The Wild Side” de Lou Reed. Se for possível não se ficar convencido, oiça-se em seguida “Encounter” ou “Land Of Flowers”... e se depois se criar a dúvida de que o disco possa manter-se a esse nível escolha-se qualquer uma das outras canções – e existem muitas hipóteses, o registo conta com 20 canções – para que ela se dissipa. “Post Industrial Trauma”, o segundo tomo do grupo, no seu todo é altamente enriquecedor para solidificar a estética criada no primeiro disco. A maior parte das características mantêm-se: temos as mesmas sugestões paisagísticas, ora enubladas, ora límpidas; criadas por uma música digital delicada, que tanto consegue ser tranquila como apenas aparentar que o é – quando evoca toda a fatalidade de um filme “Noir” -; acompanhada por vozes monocórdicas que praticamente ronronam ao microfone quando isso é necessário. E assim sendo, basicamente aquilo que se quer transmitir é que os Post Industrial Boys continuam a criar uma Pop Electrónica indispensável, por isso venha o terceiro tomo. (8,5/10)

quarta-feira, janeiro 10, 2007

Electrónicas (5)

“Silent Shout” by The Knife.
(2006 / Mute)

Foi sem dúvida um lançamento estimulante, este “Silent Shout” dos The Knife. Bizarro que baste para colocá-lo na prateleira da melhor música alternativa que por aí se faz, sorve no entanto para o seu universo uma sensibilidade eficaz de plena qualidade Pop, que injecta nesta música um humanismo essencial à maquinaria industrial utilizada. Prevalece no entanto, e sempre, a utilização de influências da corrente Tecno, por isso não será de surpreender o quanto o álbum consegue ser descarnado na sua vertente melódica; injectando doses suficientes de inquietação no seu conteúdo, que não deixam propriamente o ouvinte reconfortado com a sua audição. Existe por aqui uma constante desagregação melódica que desafia o ouvinte a ouvir as soluções que são adoptadas, fazendo porém, com mestria, com que ele não se sinta defraudado por aceitar tal desafio. No seu todo, é uma obra genuína a que os The Knife nos presenteiam em 2006 - a sua melhor -, que serve ainda para celebrar o que de melhor da música electrónica se faz actualmente. (9,5/10)

terça-feira, janeiro 09, 2007

Electrónicas (4)

“Tasankokaiku” by Shogun Kunitoki.
(2006 / Fonal Records)

Tal como o nome, a música de Shogun Kunitoki não é propriamente fácil de reter, mesmo que esta seja constituída por um conjunto de retalhos mais ou menos identificáveis. O quarteto, vindo da Finlândia, explora com devoção o universo do Krautrock como que este fosse a fonte ideal para revelar paisagens psicadélicas, encontrando assim uma linguagem muito própria; que, por muito que evoque referências, nenhuma delas serve para definir em particular aquilo que “Tasankokaiku” é. O álbum em si é constituído por sete peças instrumentais analógicas que evoluem de forma vibrante (adjectivo aplicado de forma literal), no entanto, devido a essa característica, essa evolução parece ser mais sugerida do que propriamente concretizada, pois esta música parece querer persistir em não evoluir para lado algum, caracterizando assim um todo abstracto que dita que apenas consegue encontrar um sentido concreto em si próprio. É uma pilhagem de som magnífica a que é apresentada nesta obra, e, caso se oiça com atenção, descobre-se que de facto existe aqui profundidade. (9/10)