segunda-feira, maio 09, 2005

Arte vs Pornografia


imagem do filme “O Fantasma” de João Pedro Rodrigues

“Aprovar ou desaprovar moralmente aquilo que uma obra de arte «diz» é tão estranho à obra como ficar-se sexualmente excitado por uma obra de arte. (Ambas as atitudes são, evidentemente, muito comuns). E as razões invocadas contra a idoneidade e a pertinência de uma aplicam-se igualmente à outra. De facto, nesta ideia de aniquilação do tema reside porventura o único critério sério para a destinação entre a literatura erótica, ou filmes, ou pintura, que são arte, e aqueles que (à falta de melhor palavra) temos de designar pornografia. A pornografia tem um «conteúdo» e é concebida para nos por em contacto (com repugnância, com desejo) com esse conteúdo. É um sucedâneo da vida. Mas a arte não excita; ou, se o faz, a excitação é aplacada, segundo os termos da experiência estética. Toda a grande arte induz à contemplação dinâmica. Por mais que o leitor, o ouvinte ou o espectador se sinta provocado por uma identificação provisória daquilo que existe numa obra de arte com a vida real, a sua reacção definitiva – desde que reaja a essa obra enquanto obra de arte – deve ser distanciada, tranquila, contemplativa, livre de emoções, para além da indignação e da aprovação.”

by Susan Sontag in “Contra a Interpretação e outros ensaios”; tradução de José Lima.