domingo, julho 24, 2005

Década de 90 revisitada


"Pre-Millennium Tension" by Tricky

A importância que Tricky teve no universo da música da passada década de 90 é incontornável. Esteve presente na feitura de um número considerável de obras superiores de então, de gente como os Massive Attack ou Bjork, e ainda veio a trabalhar com PJ Harvey. No entanto a sua criatividade artística afirmou-se aquando o lançamento de "Maxinquaye", o seu primeiro álbum a solo, uma obra capaz de eclipsar toda uma carreira, a qual segue como sendo a maior referência do músico (Martina Topley Bird e Allison Goldfrapp são nomes familiares a esse registo).
A criatividade deste senhor não se esgotou por aí, logo de seguida produziu outros discos de igual qualidade, que no entanto não atingiriam a mesma mediatização devido aos territórios explorados, gradualmente mais densos, tenebrosos e claustrofóbicos. Essa tendência está desde logo presente em "Nearly God", que sucedeu o disco de estreia e antecede "Pre-Millennium Tension", talvez o seu disco menos imediato.
"Pre-Millennium Tension" ganha o seu equilíbrio na confusão. Exibe um verdadeiro cataclismo sónico; a quantidade de soluções encontradas para os arranjos é impressionante, qualquer instrumento é aqui posto ao serviço da criatividade, usa-se por ser necessário, da forma que melhor se adequa (muitas das vezes pouco convencional) aos ambientes que se pretendem criar. Não se encontram aqui arranjos lineares, nem simples. Tudo se sobrepõe em camadas, compostas por pormenores a serem descobertos (e redescobertos) em todas as audições. E depois surgem as vozes. As vozes quentes e sensuais, trágicas e paranóicas, agressivas e demoníacas; maioritariamente sussurradas, que de forma precisa se expõem e desvendam através das letras parte daquilo que este universo encerra (a presença Martina Topley Bird é uma vez mais incontornável). Ao diluírem-se todos esses elementos o que daí descende é uma obra rica em novas melodias e soluções que de outra forma, ou noutro contexto, não poderiam originar a coerência que o registo acaba por encerrar.
É certo que posteriormente a carreira de Tricky viria a oscilar, os álbuns desta década não têm a qualidade da anterior, e parece dominar a pressão para que o músico edite outro "Maxinquaye". Até agora não o tentou fazer, por muitas manobras de marketing que as editoras multinacionais (contra as quais entretanto se revoltou) tenham aplicado aos últimos registos nesse sentido. Porém ninguém lhe tira o estatuto e a importância alcançada, assim como o reconhecimento por parte da crítica a nível mundial, das suas obras dos anos 90. Exilado de toda a produção musical da altura a sua música tornou-se em si um género. (10/10)