quarta-feira, maio 25, 2005

Tu que não eras perfeito
até o meu olhar te ver
levas-me a escrever apaixonadamente estas palavras
e a amar as longas horas noctívagas
que acompanham a minha solidão.

quinta-feira, maio 19, 2005


Partiu. Partiu com aparente tranquilidade, satisfação e sorridente. Deixá-lo ir dessa forma é para si uma grande prazer, uma boa imagem para reter na memória. Enrosca-se nos lençóis. É agora a vez dele sorrir. Um sorriso aprazível. Pensa que poderia escrever-lhe uma carta, um e-mail, uma canção, um poema. Pensa naquilo que lhe poderia escrever. Diverte-se com esses pensamentos. Com todos os clichés que podia usar, com todas a lamechices que poderia redigir. Reflecte… agora está um pouco mais ciente. Pensa na entrega que acaba de lhe presentear. Por agora pode ser suficiente. Hoje não precisa de lhe demonstrar mais coisa alguma, terá as oportunidades necessárias para o fazer quando as situações o proporcionarem. E com todos os gestos, atitudes, rendições e partilhas que poderão advir irá provar-lhe tranquilamente que o amor pode ser isso; que não é apenas mais uma palavra bonita que se solta da boca, como todas as outras que se podem soltar - que tendem a revelar-se desnecessárias e desesperadas quando o significado delas não é comprovado.

sábado, maio 14, 2005


Acabou agora mesmo. Pega no telemóvel e liga-lhe. Ouve a voz do outro lado. Agradece-lhe por o fazer sentir assim. Desliga. E pensa… pensa no quanto a vida pode ser bela, que vale a pena vivê-la por ser capaz de desenvolver nele sensações como a que acaba de experimentar. E sorri. Retêm agora na sua memória a imagem do corpo dele, os gestos dele, o toque dele. Pensa no quanto ele é encantador. Pensa em momentos vividos com ele e deixa-se divagar numa fusão de realidade e de possibilidades dela. Pensa na última vez que estiveram juntos, na última vez que dormiram juntos, na última vez que se beijaram, na intensidade da última vez que foderam. Anseia pela próxima vez. Masturba-se novamente.

quarta-feira, maio 11, 2005

Persegue a sombra
que vejo exposta diante de mim,
(… guiá-la-ia se lhe desse permissão)
encarcerado num corpo que a qualquer momento pode estilhaçar.

São-me agora indiferentes as palavras usadas para lhe dar forma,
que para além de se revelarem insuficientes confinam a sua dimensão.

E porquanto a satisfação não proporciona…
Preenche o vazio que o lugar dele poderia ocupar.

terça-feira, maio 10, 2005

Earl & Mooch

segunda-feira, maio 09, 2005

Arte vs Pornografia


imagem do filme “O Fantasma” de João Pedro Rodrigues

“Aprovar ou desaprovar moralmente aquilo que uma obra de arte «diz» é tão estranho à obra como ficar-se sexualmente excitado por uma obra de arte. (Ambas as atitudes são, evidentemente, muito comuns). E as razões invocadas contra a idoneidade e a pertinência de uma aplicam-se igualmente à outra. De facto, nesta ideia de aniquilação do tema reside porventura o único critério sério para a destinação entre a literatura erótica, ou filmes, ou pintura, que são arte, e aqueles que (à falta de melhor palavra) temos de designar pornografia. A pornografia tem um «conteúdo» e é concebida para nos por em contacto (com repugnância, com desejo) com esse conteúdo. É um sucedâneo da vida. Mas a arte não excita; ou, se o faz, a excitação é aplacada, segundo os termos da experiência estética. Toda a grande arte induz à contemplação dinâmica. Por mais que o leitor, o ouvinte ou o espectador se sinta provocado por uma identificação provisória daquilo que existe numa obra de arte com a vida real, a sua reacção definitiva – desde que reaja a essa obra enquanto obra de arte – deve ser distanciada, tranquila, contemplativa, livre de emoções, para além da indignação e da aprovação.”

by Susan Sontag in “Contra a Interpretação e outros ensaios”; tradução de José Lima.

sexta-feira, maio 06, 2005

PJ Harvey - To Bring You My Love B Sides




Maniac


One time too many


Harder


Somebody's down somebody's name

A vida resume-se a viver e a compreender aquilo que ela é.

quinta-feira, maio 05, 2005

Pooch Café

terça-feira, maio 03, 2005

Nina Simone


Nina Simone (1933 - 2003), cantora, pianista e compositora disse: “Jazz é uma palavra branca para uma música negra.” Com essa frase, para além de definir grande parte da sua personalidade, rejeitou o estereótipo, piedosamente concedido pelos brancos, de “musa do jazz” (expressão usada para definir as cantoras negras das décadas de 50 e 60). Recusa que bem pode ter sido a responsável por a levar a investir e a remodelar os mais variados estilos musicais.
Perpétua a sua índole forte com a tomada de uma inconformada posição em relação à situação dos direitos civis nos Estados Unidos. Num país onde via aplausos e racismo a caminharem de mãos dadas deixou a sua marca indelével no cenário político: tomou uma postura absolutamente contrária à discriminação racial renunciando, em 1969, a sua nacionalidade, a propósito do assassinato do líder pacifista Martín Luther King. Defendeu ainda outros direitos universais, nomeadamente os femininos, devido aos quais chegou a ver canções suas proibidas nas emissoras de rádio de Filadélfia e dos Estados Unidos.
O que ainda irá perpetuar é sua incontestável versatilidade a nível artístico. Explorou os territórios do soul, dos blues, do gospel, de canções tradicionais e da pop com a mesma destreza que os do jazz. O modo inconfundível como tocava piano, influenciada pelo grande senhor do swing Duke Ellington, atravessa todas as suas canções, migrando com grande perícia entre os silêncios e as pausas para arranjos arrebatadoramente fortes, ásperos e elegantemente desconcertados. A sua interpretação, nem tanto pela técnica, mas devido à emoção e à forma como se entrega nas canções, poderia ser classificada como soul. Tudo isso acompanhado por um timbre fragoso de uma voz rasgada, intensa e passional, que tanto conseguia ser agressiva e desgostosa como sofisticada; revestindo a força de uma personalidade que viu o seu talento comparado ao de Billie Holliday (considerada a maior intérprete de jazz de todos os tempos pelos críticos).
Faleceu em sua casa, aos 70 anos, em plena actividade.

domingo, maio 01, 2005

Excertos


"She Wolf" by Jackson Pollock

“A interpretação dá por assente a experiência sensorial da obra de arte, e usa-a como ponto de partida. Hoje, não se pode dar por assente. Basta pensar na mera multiplicação de obras de arte disponíveis para cada um de nós, a juntar-se aos sabores, odores e visões contrastantes do ambiente urbano com que os nossos sentidos são bombardeados. A nossa cultura está baseada no excesso, na sobreprodução; o resultado é uma gradual perda de agudeza da nossa experiência sensorial. Todas as condições da vida moderna – a sua abundância material, a sua fraca aglomeração – conjugam-se para amortecer as nossas faculdades sensoriais. E é à luz das condições dos nossos sentidos, das nossas capacidades (e não das de outra época), que se deve determinar a função crítica.
O que é importante hoje é recuperar os nossos sentidos. Temos de aprender a ver mais, a ouvir mais, a sentir mais.
A nossa tarefa não é descobrir numa obra de arte o máximo de conteúdo, e ainda menos espremer mais conteúdo de uma obra do que aquele que já lá está. A nossa tarefa é reduzir o conteúdo de modo a podermos ver realmente o que lá está.
O objectivo de qualquer comentário sobre arte deveria ser nos nossos dias tornar as obras de arte – e, por analogia, a nossa própria experiência – mais, e não menos, reais para nós. A função da crítica devia ser mostrar como é o que é, ou mesmo que é o que é, em vez de mostrar o que significa.”

by Susan Sontag in “Contra a Interpretação e outros ensaios”; tradução de José Lima.