quinta-feira, agosto 31, 2006

Pooch Café

quarta-feira, agosto 30, 2006

O rapaz 2 com a outra e o rapaz 1 com os outros

O rapaz 1 contraiu-se; não a deixou acomodar-se logo de inicio... por um instante pensou em desistir; no entanto os outros eram um casal atraente e o caos em seu redor estava instalado, deixou a do primeiro acomodasse e depois deixou a do outro acomodar-se também. A do rapaz 2 estava acomodada na da outra. A outra apercebeu-se do estado de desassossego do rapaz 2 mas não comentou o facto, deixou que ele se acomoda-se nela e desempenhou o papel que habitualmente executa quando se acha com ele nessa condição. Nessa noite, deu-se o primeiro contacto intimo entre o rapaz 2 e o rapaz 1, um beijo inacabado, que no caso do rapaz 2 teria sido o primeiro que recebeu de um homem... um elementar e inacabado beijo... mas desta vez admitiu que esse contacto físico o excitava, devido a isso fodeu-a como nunca o tinha feito antes e ao vir-se experimentou uma sensação que desconhecia.

in "A morte do desejo" by JGSC.

terça-feira, agosto 29, 2006

O rapaz 1

A impulsividade não seria um meio para se relacionarem. Não lidavam bem com o elemento surpresa; tudo teria de ser bem pensado previamente para parcimoniosamente ser executado.
Numa noite cruzaram-se inesperadamente num local aonde já se poderiam ter encontrado antes. O rapaz 1 tinha bebido e fumado excessivamente, foi num estado que o podia ilibar de todo o comprometimento que se deparou com o rapaz 2 a olhar directamente para ele... este ficou especado à sua frente, prestes a deixar de sorrir... Nesse preciso momento o rapaz 1 ouviu distintamente o verso da música: “The most tender place in my heart is for strangers”... deu então um beijo nos lábios do rapaz 2 antes que este pudesse dissipar por completo o sorriso que ainda sustinha, olhou-o fugazmente e lançou-lhe um sorriso inacabado que lhe poderia ter sido oferecido pelo rapaz 2... O rapaz 2 não completou o sorriso, deixou que o rapaz 1 seguisse para o meio da multidão que dançava e que se perdesse nela; e foi à procura do seu caminho...

in "A morte do desejo" by JGSC.

sexta-feira, agosto 25, 2006

Veracidade versus Utopia

"Beethoven" by Max Klinger.

“Uma vez que a filosofia, a medicina e o direito estão longe de fazer a felicidade do homem, talvez a arte o consiga. Pelo menos é isto o que pensam os professores membros da Secessão, que em, 1902, decidiram aproveitar-se da 14ª exposição do seu movimento para apresentar em Viena, numa homenagem a Max Klinger, a sua escultura em mármore policromo, consagrada a Beethoven. Na realidade Klimt e os seus amigos vêem em Beethoven a encarnação do génio e na sua obra a exaltação do amor e do sacrifício capazes de trazer ao homem a salvação. Para esta geração decididamente utopista, somente a arte é capaz de assegurar a regeneração do mundo. É pela unificação de todas as artes (Gesamtkunstwerk) que a quimera se tornará realidade.”

in “Klimt” by Gilles Neret, traduzido por Jorge Valente.

quinta-feira, agosto 24, 2006

O que foi dito ao rapaz 1 por ela

- Não há o que possas dizer quando há tudo para dizer!?... Não há nada mais ensurdecedor que o silêncio no entanto foi ele que se apoderou de ti... Deixa de ficar imerso nesse caos que se instalou em ti, de seguires só nas noites, de te perderes na sua imensidão, liberta-te daquilo que é fugaz deixando de ponderar que esse homem possa vir a ser teu amante. E se o caos se impuser cria-o em teu redor, no seu seio irás encontrar a ordem e a aniquilação do desejo acabará por ser completa... O fim do romance não há-de chegar; sairás engrandecido na mesma dimensão da tua perda, será porém inevitável teres de lidar com ela.

in "A morte do desejo" by JGSC.

quarta-feira, agosto 23, 2006

Spot The Frog

terça-feira, agosto 22, 2006

Breve história do rapaz 1 e do rapaz 2

O rapaz 1 e o rapaz 2 viviam bem um sem o outro mas mal com a perda da capacidade de conseguirem conviver devidamente um com o outro. O rapaz 1 desejava que o rapaz 2 o desejasse do modo como ele o desejava, sem saber que o rapaz 2 apenas desejava que o desejassem. O rapaz 1 era capaz de o desejar... e o rapaz 2 deixava ser desejado; e os dias foram passando. Passaram-se dias e dias, semanas e semanas, meses e meses... o convívio manteve-se mas o desejo não... até que um dia o rapaz 2 morreu. Morreu sem que o rapaz 1 soubesse ser desejado pelo rapaz 2; este nunca lho dissera ou demonstrara convenientemente, apaixonou-se primeiro pelo desejo com que o rapaz 1 o desejava e depois pelo rapaz em si, mas o convívio manteve-se... O rapaz 1 nunca conviveu com o rapaz 2 da forma como desejava e ficou vivo... está vivo... agora questiona o tempo que dedicou a demonstrar discretamente o seu desejo pelo rapaz 2 e deixou de reflectir sobre a morte deste.

in "A morte do desejo" by JGSC.

segunda-feira, agosto 21, 2006

A obra-prima desconhecida (passagem)

“Se o artista não se precipita na sua obra como Curtius no seu abismo, como o soldado para o meio da refrega, sem reflectir, e se, nessa cratera, ele não trabalhar como o mais indefeso refugiado numa derrocada; se se puser a contemplar as dificuldades em vez de as vencer uma a uma, como esses amantes de fadas que para alcançar as suas princesas se põem a combater encantamentos renascentes, a obra ficará inacabada, perecerá no fundo do atelier, onde produzir se torna impossível e o artista assiste ao suicídio do seu talento.”

in "A obra-prima desconhecida" by Honoré De Balzac.

domingo, agosto 20, 2006

Arte que alcançou o 7º lugar


“Innocence” by Lucile Hadzihalilovic.

“Innocence” de Lucile Hadzihalilovic retrata a educação nas áreas do ballet e da natureza que uma série de meninas recebem num colégio localizado num bosque isolado do mundo; um sítio deslumbrante mas estranho, capaz de provocar uma série de reacções comportamentais divergentes a cada uma das personagens, e onde não existem adultos, salvo algumas criadas idosas e duas melancólicas jovens tutoras. O filme assim apresentado poderá logo à partida não provocar grande exaltação no entanto se for adicionado o dado que o argumento de “Innocence” foi criado com base na adaptação de “Mine-Haha ou a educação corporal das meninas”, uma obra de Frank Wedekind (o mesmo autor de “Lulu”), será então de esperar que uma áurea de controvérsia se instale à volta do filme. A controvérsia instalou-se decididamente, e a própria realizadora fez questão de a espicaçar ao admitir que o filme pode ser alvo de acusações de perversão. As acusações teriam assim de acontecer... uma abordagem simplista do filme pode desde logo reduzi-lo a um exercício de instigação à pedofilia; no entanto talvez aqui a máxima - adaptada para este contexto -, de que a depravação está no olhar de quem vê o filme dessa forma, se adeqúe na perfeição. É um facto que o filme não se preocupa em esconder a sexualidade das meninas, apresentando-a exemplarmente de modo quase pictórico em determinados enquadramentos, mas trata-se de uma sexualidade que é de todo debilitada pela própria candura da interpretação das personagens e pelo próprio olhar que a realizadora acaba por ter perante elas, o que faz com que seja emanada uma forma pura e genuína de beleza, que por perturbar o espectador inibe qualquer aproximação ao desejo sexual. É a inocência que o filme aborda, e aborda-a magnificamente em diversos níveis que, em vez de serem explorados, vão sendo simplesmente apresentados para que se levantem questões que ficam a cargo de serem respondidas pelo espectador.
Ultrapassada a controvérsia do argumento temos a realização. A realização deste filme é soberba, segura e engenhosa. Trata-se mesmo de uma estreia prodigiosa a esse nível, existem ali dos melhores planos feitos para cinema, trabalhos de “traveling” magníficos e uma captação de imagem extremamente lúcida, uniforme e coerente. Benoît Debie, o director de fotografia, é também plenamente eficaz no controlo do imaginário do filme, ajudando a criar um ambiente que tem tanto de resplandecente como de sinistro. Ambos, o director de fotografia e a realizadora, fazem assim com que o filme seja visualmente extravagante e que a transfiguração do meio realista em que se desenvolve seja ludicamente tornado onírico (algo raro de se ver concretizado convincentemente no cinema).
O filme tem vindo a arrecadar tanto críticas entusiastas como críticas arrasadoras, agora; nada demove que o nome de Lucile Hadzihalilovic seja desde já uma referência para quem aprecie cinema, tanto a nível técnico como a nível de instrumento de debate. (9,5/10)

[TRAILER]

sexta-feira, agosto 18, 2006

Hellen van Meene




Untitled photos by Hellen van Meene.

terça-feira, agosto 15, 2006

Harmonias

“Quixotic” by Martina Topley-Bird.

“Quixotic” foi um daqueles álbuns que passou completamente desapercebido aquando do seu lançamento em 2003. Foi escassa a sua divulgação, a sua distribuição e, lamentavelmente, a apreciação que se fez dele. E até agora praticamente nada mudou. É de lastimar isso visto que a responsável pela sua criação é não só um dos marcos dos anos noventa devido às suas colaborações nas obras-primas de Tricky ("Maxinquaye" e "Pre-Millennium Tension" - que o são por em parte muito deverem às suas vocalizações), mas também porque sempre que se tem a oportunidade de ouvir a sua voz prevê-se à partida que no fim da audição o ouvinte irá sentir-se grato por se ter dedicado à sua contemplação.
Martina Topley-Bird tem de facto uma voz esplêndida, quente e sensual, que liberta as palavras de forma aquosa e com uma languidez narcótica que deixam o ouvinte suspenso enquanto as ouve. A temática utilizada nos trabalhos anteriormente desenvolvidos, continua presente. Nas letras desta música não é assim de esperar um carácter idílico, a profundidade daquilo que Martina Topley-Bird profere aborda os receios mais íntimos do ser humano, existe uma grande aproximação à inquietação e à ânsia expositivamente exprimidas após terem sido assimiladas e de se ter aceitado o facto de ser inevitável de lidar com elas para, talvez devido a isso, agora se poderem apresentar de modo plácido; novamente de forma exemplar e intransferível em Quixotic. Mas também existe espaço para se falar de entrega e de desejo, de amor até, se se quiser aceitar essa perspectiva, sendo “Anything” exemplo cabal disso.
Nos arranjos da música podemos encontrar os cúmplices que seriam de esperar, como David Holmes ou Tricky e as colaborações inesperadas de Josh Homme (Queens Of The Stone Age) e de Mark Lanegan. Um desfile de nomes que tinha a responsabilidade de elevar a música ao nível do desempenho vocal de Martina Topley-Bird, porém ficam um pouco aquém o que baixa a fasquia do álbum. Não se tratam de composições duvidosas, apenas por vezes parcas na densidade que se pode exigir desses criadores e surpreendentemente escassas de perversidade sonora. Este último facto acabou por desviar este trabalho dos ambientes de retracção, por onde a cantora sempre se tinha movido, para ambientes expansivos que fazem com que Quixotic seja melodiosamente distinto de qualquer trabalho do seu passado ou com que se possa impor uma referência plausível por muito que se possam abordar aproximações aos blues, gospel ou à soul.
“Quixotic” merece que se tenha em mais consideração do que se tem tido, não será tarde nem cedo para mudar essa circunstância, porém negligente se não for alterada. (8/10)

domingo, agosto 13, 2006

Earl & Mooch

sábado, agosto 12, 2006

Harmonias

“Whip It On” by The Raveonettes.

E porque há discos aos quais se volta amiudadamente por este ou por aquele motivo, fica aqui um olhar do álbum “Whip It On”, o primeiro dos Raveonettes, originalmente editado em 2002.
“Whip It On” foi um dos lançamentos inserido na vaga revivalista do Rock que se iniciou na primeira metade da presente década. Logo à partida o imaginário utilizado desperta a curiosidade e o interesse pelo objecto: o uso das estéticas inventadas nos filmes “Noir” e de “Série B” dos passados anos 50 e 60 tanto na parte gráfica do álbum como nos vídeos. A curiosidade é também espicaçada pelo facto de o álbum ter um som “estereofónico explosivo” e de apenas ser gravado num único tom, um “glorioso si menor"; como se publicita na capa do disco. Sabe-se ainda à partida que na feitura das oito canções se recorre apenas a três acordes, sendo que a duração de cada uma praticamente nunca ultrapassa os três minutos... E depois há as referências musicais a Jesus and Mary Chains e Velvet Underground; e, nas letras, a menção à geração “Beat” da literatura, com Jack Kerouac em destaque. O álbum tem assim todos os ingredientes necessários para se proceder à sua audição, na expectativa de se encontrar aquilo que todas as referências evocam: sexo, drogas e rock’n’roll; com todo o entusiasmo que a ideia contém em si, tudo integrado num ambiente soturno.
Depois ouve-se o álbum, e este passa como um autêntico furacão. O que é sugerido antes da audição é cumprido e os seus quase vinte e dois minutos de duração, sustentados no ruído e na fúria dos pedais de distorção, são dos mais excitantes que se ouviram no ano de lançamento do álbum. Acima de tudo o álbum é isso, excitação... habilmente retirada da densidade de alucinações nocturnas provocadas por estupefacientes e dos comportamentos desviantes que daí advêm, cerebralmente bem pensada e lucidamente bem executada nos dogmas utilizados.
Uma estreia colossal, aonde se apresenta um disco capaz de manter toda a sua intempestividade e coerência no decurso das audições que recorrentemente se farão a ele. (9,5/10)

Sune Rose Wagner


Sharin Foo

sexta-feira, agosto 11, 2006

Literature.org

Judith II (Salomé) by Gustav Klimt

Foi recentemente adicionada na secção de literatura do "BLUE RED and DARK" uma ligação para Literature.org. No sitio, constam textos integrais de obras de referência de vários escritores clássicos. Podem-se encontrar por lá obras da autoria de Bram Stoker, Emily Bronte, Fyodor Dostoevsky, Honore de Balzac, Mary Shelley, Rene Descartes ou de Voltaire, entre outros... Um sítio para descobrir e dedicar-lhe muito tempo.

quarta-feira, agosto 09, 2006

Sobre Ele, quando não há tudo que se possa expressar

Crio-as... Destruo-as. São necessárias para me proteger dele...para me entregar... Não lhe sou imune... Aquilo que se escreve dele Sei não ter utilidade... Sei que se mantém enquanto o seu entendimento É apenas incompreensível... Os acessos ao seu reconhecimento Ao tentarem dar-lhe forma, perdem-se em si e na dimensão que o sustém. Assim, ele vai e vem E eu desisto de o moldar...
Volta sempre grandioso, pronto a devolver-me o que de melhor tem Para levar consigo tudo o que ainda possuo.
Dá-me um pouco de vida para após ma retirar para se ir mantendo vivo... Não consegue passar sem mim assim como não consigo passar sem ele, ao tenta-lo expurga-lo recua e fica e espera... Espera até que eu esteja pronto a recebe-lo novamente Para ser alimentado, consumido-me impiedosamente. Assim apresentar-se-á grandioso... e grandioso se há-de manter na afeição que por ele tenho.

terça-feira, agosto 08, 2006

Calvin & Hobbes - Hot Summer

domingo, agosto 06, 2006

Les Voleurs (passagem)

"Out of the closet and into the museums, libraries, architectual monuments, concert halls, bookstores, recording studios and film studios of the world. Everything belongs to the inspired and dedicated thief. All the artists of history, from cave painters to Picasso, all the poets and writers, the musicians and architects, offer their wares, importuning him like street vendors. They supplicate him from the bored minds of school children, from the prisons of uncritical veneration, from dead museums and dusty archives. Sculptors stretch forth their limestone arms to receive the life-giving transfusion of flesh as their severed limbs are grafted onto Mister America. Mais le voleur n'est pas pressÈ - the thief is in no hurry. He must assure himself of the quality of the merchandise and its suitability for his purpose before he conveys the supreme honor and benediction of his theft.

Words, colors, light, sounds, stone, wood, bronze belong to the living artist. They belong to anyone who can use them. Loot the Louvre! A bas l'originalitÈ, the sterile and assertive ego that imprisons as it creates. Vive le vol - pure, shameless, total. We are not responsible. Steal everything in sight."

by William Burroughs in "Les Voleurs".

sábado, agosto 05, 2006

Harmonias

“The Eraser” by Thom Yorke.

No suplemento Y de 7 de Julho de 2006, do jornal Público, João Bonifácio escreveu sobre o mundo que Thom Yorke construiu até editar “The Eraser”, o seu primeiro álbum a solo. Estamos de acordo com aquilo que é dito... Thom Yorke é possuidor de um talento único e está-se longe de lhe reconhecer a dimensão do trabalho que tem vindo a desenvolver. Tem no entanto a seu favor o facto de ser reconhecido enquanto génio, embora muitas das vezes de forma indolente, mas irá de certo ser alvo de várias análises que posteriormente irão dignificá-lo como merece, tornando-o num símbolo daquilo que a pós-modernidade é, e o impacto que esta provoca no individuo.
“The Eraser” não é à partida uma surpresa. Já se teriam ouvido insinuações do criador no mapa interno agora traçado nos álbuns dos Radiohead, ou não tivesse Thom Yorke assumido toda a responsabilidade na criação daquele que é um dos mais magníficos objectos musicais da viragem de milénio – “Kid A”. Foi arrojada e provocante a metamorfose operada em termos sonoros em relação ao seu antecessor, o descomunal “Ok Computer”; mas estaria longe de ser uma ruptura artística perante ele; assim como o não é “The Eraser”, perante a obra dos Radiohead. Não se pretende retirar o mérito que têm os restantes elementos da banda enquanto pertencentes a um mesmo conjunto engenhoso, a análise aqui no entanto apenas está a passar por Thom Yorke, e é perante este ponto de vista que se reconhece que existe uma constância de linguagem utilizada ao longo do trabalho do músico, uma espécie de assinatura, se assim se lhe quiser chamar, que permite reconhecer aquilo que é emanado dele. Não será apenas a admirável criatividade ao longo da sua carreira, uma das melhores de sempre, assente nas suas paranóias; arrisca-se a dizer que se está perante o exorcismo da imensurabilidade de visões catastróficas traduzida em elementos sonoros. E se bem que isso possa parecer mais ou menos óbvio, evidente não será a percepção da sua obra enquanto tal, porque se o fosse provavelmente não se conseguiria ouvir novamente a sua música após ganhar-se de facto a consciência da profundidade dessa noção. Porém não é esse o tipo de aproximação que se faz à Música enquanto arte, está-se longe de afigurar poder-se reconhecer uma obra-prima que, por sê-la, tem de ser rejeitada, muito menos neste meio em questão; assim será mais confortável ser-se auditivamente negligente perante “The Eraser”. Thom Yorke já afirmou que a música que cria deixa-o doente, verosimilmente é assim que o ouvinte fica ao acercar-se verdadeiramente da sua obra, daí o seu mérito. (9/10)

Para além de ser de “Thom Yorke”, “The Eraser” também é de Stanley Donwood. Este último, o responsável pela assombrosa parte gráfica do álbum.
Stanley Donwood, que também tem vindo a desenvolver o design gráfico dos trabalhos dos Radiohead, criou “London Views” que acabaria por vir a figurar em “The eraser”. O trabalho é inspirado em ilustrações de um apocalipse medieval de Michael Wohlgemut & Wilhelm Pleydenwurff, presentes numa compilação de Hartman Schedel, publicada em 1943, que traça a história do mundo desde a sua criação até à presente data, com o nome de Liber Chronicarum.
O representado em “London Views” é uma visão apocalíptica do estuário do rio Tamisa, com as edificações emblemáticas de Londres rio acima impotentes perante a vastidão da destruição. Será com certeza um imaginário que complementa magnificamente a audição do álbum e que faz com que o objecto musical se torne ainda mais precioso.

London Views” by Stanley Donwood.

sexta-feira, agosto 04, 2006

Leituras entre lençóis

"Drácula" by Bram Stoker.

Baseando-se nas superstições propagadas pelas gerações dos povos balcânicos, com origem no personagem histórico Vlad III, Bram Stoker (1847-1912), escreveu no final do século XIX aquele que é considerado hoje um dos clássicos da literatura gótica: o romance epistolar “Drácula”.
O romance narra o impacto que o conde Drácula causa numa viagem que faz a Inglaterra e como é que ele irá abalar a vida de uma série de personagens que até à data teriam entre si uma relação despreocupadamente burguesa. Essas personagens são: Jonathan Harker e a sua noiva Mina Murray; a amiga de Mina, Lucy Westenra; os pretendentes de Lucy, Quincey Morris, Arthur Holmwood e o cativante John Seward; o paciente de Dr. Seward, o perturbador Renfield e finalmente o cientista ortodoxo, interessado em crenças tenebrosas, Van Helsing. Enumeram-se as personagens apenas pelo facto de serem todas elas tão esplêndidas como o é o próprio conde; existe profundidade na definição delas todas, o que leva o leitor a sentir os dramas vividos por cada uma e a apegar-se a elas ao longo da estória visto conseguirem adquirirem a sua liberdade enquanto elementos únicos. Aqui, ao contrário do que posteriormente viria a ser explorado no cinema, não se toma o facção de Drácula; este é criado com grande encarniçamento, tanto no sentido de paixão, por ser uma criatura possuidora de impressionantes faculdades; como no sentido de crueldade, por, em contraposto, possuir tais virtudes devido ao facto de ser uma entidade diabólica - e aqui não há qualquer acepção de fascínio, mas sim a interpretação de estarrecimento perante tal facto. Essa ambiguidade de aproximação ao conde fará com que o romance possa exprimir uma admirável metáfora de alusão ao desejo da imortalidade suprimida pela necessidade da morte, usando para o efeito a força cabal da religião.
Quanto à narração, ela não podia começar com mais fulgor. Desde o inicio o leitor é envolvido num ambiente angustiante, misterioso, sugestivo e ilustrativo. Esse ambiente ao ser exposto a partir de documentos ilusoriamente factuais impõem o empenho na leitura da sequência de peripécias que os personagens vivem. Sofrerá uma pequena perda de ritmo na exploração da metamorfose de Mina após a da Lucy; no entanto essa quebra será aproveitada para justificar o novo ímpeto que ganham entretanto as personagens masculinas da obra.
Bram Stoker soube combinar habilmente intriga e terror nesta magnífica obra; não sendo assim de estranhar que o seu nome fique eternamente ligado nesta escrita capaz de subjugar o leitor da primeira à última página. (9,5/10)

quarta-feira, agosto 02, 2006

Arte que alcançou o 7º lugar


"Dracula" by Tod Browning.

Não deixam de ser irónicas as primeiras adaptações que se fizeram para o cinema do romance de Bram Stoker... Em 1922, o grande F. W. Murnau apresenta a sua versão para o cinema de “Dracula”, que seria também a primeira adaptação a ser feita para o grande ecrã, sob o disfarce de Nosferatu; e realiza um dos mais excepcionais filmes de sempre, utilizando com grande mestria os jogos de luzes e sombras na alusão à grande batalha do romance entre o bem e o mal, contornando de forma eficaz as limitações que a tecnologia da altura poderia causar, ou não fosse Murnau um dos maiores realizadores do movimento expressionista alemão. Quem não apreciou a homenagem a Stoker foram os gestores do seu património, que obrigaram o realizador a alterar os nomes das personagens e os locais da estória, e que mesmo assim quase levaram a que o filme fosse extinto por completo. A estória no entanto mantêm-se e é das mais fulgurantes adaptações que se fez desse clássico da literatura gótica para o cinema.
Em 1931 é a vez de Tod Browning apresentar a sua versão de “Dracula”. Desta vez os nomes mantêm-se no entanto a inspiração para o filme não se foi buscar ao romance mas sim a duas das suas adaptações para teatro, uma delas a cargo de Hamilton Deane e outra a cargo de John L. Balderston; não sendo assim de estranhar a condensação da acção e do espaço físico do argumento do filme de Browning.
“Dracula” em termos de realização não será tão inspirado quanto o é “Nosferatu, eine symphonie des grauens”, no entanto pode-se considerar que é o filme que teve o alento necessário para impulsionar um dos géneros incontornáveis no cinema: o filme de terror. Tod Browing ameaçava conseguir algo do género dada a temática grotesca dos seus filmes, e o que é certo é que o conseguiu. O filme, acaba mesmo por ser tão sombrio quanto o é o romance, devido aos magníficos cenários que apresenta e, sobretudo, devido à interpretação carismática de Bela Lugosi. O actor, que interpreta o conde Drácula, nem sequer teria sido a primeira escolha do realizador, porém revelou-se um dos mais dedicados protagonistas de sempre, interpretando o papel com um inconfundível sotaque húngaro - visto que nem sequer falava a língua inglesa - e com pequenas luzes direccionadas aos olhos para enaltecer a sobrenaturalidade do ser que encarnava; sendo assim o responsável por fazer com que o grande deslumbramento do filme fosse de facto a presença do mal e por despertar a afeição da cultura popular do século XX pelo lado sombrio do cinema. (8/10)







terça-feira, agosto 01, 2006

Pooch Café