quarta-feira, novembro 30, 2005

Impressionou (04)

“Funeral” by Arcade Fire

Lançado nos EUA em finais de 2004, “Funeral” chega ao mercado europeu apenas em 2005 e trata-se de uma das melhores surpresas (se não mesmo a melhor) no seio do Rock alternativo.
Os canadianos Arcade Fire decidem inquietar-nos com a morte a partir do ponto de vista da adolescência, num álbum conceptual que não se deixa cair na armadilha de se tornar pretensioso. Os fantasmas dos familiares dos elementos da banda são convidados a juntarem-se a uma festa que celebra a vida de forma intensa e apaixonada.
E é com um festejo memorável com que se é presenteado. Durante a audição do disco encontramos doses equilibradas de ambientes góticos, energias pertencentes ao universo Rock ou charmes da “Chanson Française”. Dessa junção surgem canções com um brilho que é raro encontrarem-se, que surpreendem pela novidade que os acordes assombrados revelam.
“Funeral” merece todo o entusiasmo com que foi recebido, e com que se pode falar dele; não é frequente encontrar obras discográficas com tal genialidade, constituídas no seu todo por grandiosas e belas canções. (9,5/10)

Impressionou (03)


"RUBY BLUE" by RÓISÍN MURPHY

Róisin Murphy encontra, definitivamente, o espaço ideal para deambular a sua voz e para explorar as suas capacidades enquanto cantora. Esse espaço, constituído por electrónicas minimais, trejeitos Jazz e por “samples” de tudo aquilo que possa produzir som (folhas de jornal incluídas), de Herbert – o cúmplice resgatado para ajudar a criar o álbum -; alberga ainda o melhor das composições que tão bem caracterizam os Moloko, banda a que pertence(u) a vocalista.
Róisin Murphy demonstra ser possuidora de uma voz distinta, que consegue moldar impecavelmente em diversas dimensões, sendo capaz lhe empregar uma teatralidade muito pessoal. Herbert, para além do poder inventivo naquilo que diz respeito às escolas dançantes, mostra uma vez mais ser possuidor do dom de saber realçar a essência e potencialidade das vozes das cantoras com quem tem vindo a trabalhar (pode-se constatar isso na audição de “Vespertine” de Björk ou em “Likes...” de Dani Siciliano). Encontramo-nos assim perante uma junção feliz de talentos, que têm a capacidade de não se anularem um ao outro, revelando um conjunto de canções impregnadas de nostalgia, melancolia, sensualidade e temperamento.
Quem também quis deixar a sua marca na obra foi o artista plástico inglês Simon Henwood, que se disponibilizou para conceber os elementos visuais do álbum.
“Ruby Blue” ostenta deste modo uma das mais deslumbrantes estreias a solo deste ano. (9/10)

domingo, novembro 27, 2005

Reedições (01)


“Goo – Deluxe Edition” by Sonic Youth

Será difícil seleccionar qual o melhor álbum da carreira dos Sonic Youth, com obras como ”Evol” (1986), “Goo” (1990) ou “Dirty” (1992 – que também já teve direito a uma magnífica reedição) a tarefa tornar-se-á complicada. No entanto também não temos de o fazer e o melhor será mesmo desfrutar o trabalho deveras significativo que o grupo produziu, um dos mais marcantes do movimento “No Wave”. No entanto isso será uma “caixinha” demasiado pequena para colocar toda uma obra que é um colossal contributo para a música no geral.
Com uma autonomia total sobre o acto criativo os Sonic Youth sempre estiveram numa posição privilegiada em relação aos seus contemporâneos, dando a conhecer trabalhos de qualidade invejável, e se bem que muitas das vezes acariciam a pop, nunca o fazem sem descartar o carisma característico dos seus elementos, e não se inibem ainda de criar peças mais experimentais, de grande liberdade artística, que resultam numa mescla sonora que pode soar estranha ao ouvido mais conhecedor e atento daquilo que se pode encontrar no universo da música dita alternativa.
Dito o anterior, a reedição de “Goo” no presente ano, agora em edição de luxo, não deve ser descurada, pois para além de conter todo o notável álbum original, remasterizado, podem-se ainda encontrar todos os “B sides”, novas misturas e originais que pertencem ao universo de “Goo”; todos reunidos numa mesma embalagem (uma belo “digipak” desdobrável que contém ainda um “booklet” com informação útil sobre esta fase da carreira da banda).
É admirável constatar como canções como “Dirty Boots”, “Tunic (Song For Karen)”, “Kool Thing” ou “Mote” continuam a ser capazes de entusiasmar e de não denunciar um resquício de passagem do tempo sobre elas, isso só para dar alguns exemplos pois todo o conjunto trata-se de um autentico clássico intemporal. (10/10)

Sonic Youth at "Webster Hall", photo by Alyssa Scheinson

quarta-feira, novembro 23, 2005

Impressionou (02)


"B Sides & Rarities" by Nick Cave & The Bad Seeds

Após o magnífico álbum duplo editado no ano passado, “Abbatoir blues / The lyre of Orpheus”, a celebrar dignamente os 20 anos de carreira de Nick Cave com os Bad Seeds; chega agora a vez de se fazer a visitação aos temas perdidos por lados B de singles, bandas sonoras e edições limitadas destes senhores. O produto final é um conjunto de 56 temas, divididos por 3 CD’s devidamente encerrados num elegante embrulho.
Não se encontram por aqui grandes sobressaltos sonoros ou líricos em relação àquilo que estamos habituados a receber de Cave, e isso é bom... Bom, visto que: o que está em questão é uma carreira com uma qualidade indiscutível; marcada pela rebeldia, por narrações sombrias, por humor mordaz, amores torturados ou consumados, e religiosidade persistente. Tudo isso ingredientes presentes nesta edição, onde ainda se utilizam os vários andamentos musicais - devidamente reformados em prol do entendimento pessoal destes excelsos músicos – com os quais estamos familiarizados, tais como: o punk, o gótico, o country, o soul, o gospel, rhythm & blues ou até o jazz; constituindo no seu todo um manancial de antropofagia sónica. A voz de Cave, que tão bem consegue ser demoníaca, torturada, pregadora, pecadora, apaixonada, atormentada ou apaziguadora; surge a dominar exemplarmente (como não podia deixar de ser) essa amálgama sonora.
B-Sides & Rarities comprova (uma vez mais) que Nick Cave & The Bad Seeds se tratam de figuras ímpares no meio da criação musical contemporânea, e quem nem nas produções secundárias se rendem à negligência artística. (8,5/10)

terça-feira, novembro 22, 2005

Impressionou (01)


"Axes" by Electrelane

Fãs do legado do Krautrock, com “Axes” as Electrelane injectam uma dose de vitalidade no género tornando-o novamente excitante e cativante.
A primeira música a fazer-se ouvir (um estimulante exercício de guitarras, teclado e bateria) define logo à partida a metodologia, às vezes mais, outras menos, acentuada que se usa na feitura das restantes: existe sempre uma preocupação inicial na criação de um ambiente fantasmagórico, misterioso, que meticulosamente, com a bateria a acompanhar o ritmo cardíaco do ouvinte, acaba por se expandir de modo perfeitamente natural num furacão de melodias criadas por instrumentos de uma época passada. E é justamente devido ao recurso dos diferentes instrumentos utilizados, como o acordeão, o saxofone ou o banjo, que não deixam que o método criativo se torne obsoleto. No entanto a guitarra eléctrica e os teclados predominam e nunca são postos de lado. A regra por instantes é quebrada para se praticar um devaneio experimental, aonde se cria uma espécie de discussão entre os instrumentos, como se a cada momento estivessem a decidir que rumo seguir, sem porém chegarem a algum consenso.
Outra mais valia do álbum é o facto de ter sido gravado como se fosse tocado ao vivo e aqui a mão de Steve Albini faz-se sentir, dando o toque de Midas final, tornando o som mais directo, denso e enérgico.
As Electrelane convidam-nos a deixar este planeta, a embarcar numa viagem até ao espaço. Podemos aterrar na lua ou então seguir noutras direcções, mas sempre acompanhados pela escuridão, rasgada apenas pelo cintilar do brilho das estrelas. (9/10)

segunda-feira, novembro 21, 2005

Maturidade consciente



"I am a Bird now" by Antony and the Johnsons

"Wind In The Wires" by Patrick Wolf

"Want Two" by Rufus Wainwright

Cada um dos presentes álbuns está dotado de características individuais muito próprias (pessoais e intransmissíveis), e os ambientes dos universos criados são claramente distintos entre si. Porém parecem existir várias características que os unem: letras vividas e calejadas, um grau de maturidade invejável, e uma dose de sedução capaz de satisfazer os fetiches mais requintados. Cada um deles acaricia a Pop, através da doçura das melodias, assim como outras correntes mais clássicas, através dos arranjos das composições; sendo capazes de criar cenários fantasistas com grande densidade teatral. Isso por se tratarem de músicos talentosos, possuidores de grande criatividade e com forte carácter.No entanto também todos eles acomodam a mesma fraqueza: a de deixar transparecer em determinados momentos, por vezes de modo quase imperceptível, a consciência que cada um dos músicos tem do dramatismo que deve empregar à obra, em vez de serem genuinamente dramáticos, o que acaba por infligir um pouco de artificialismo que não é de todo desejável. (8/10)

domingo, novembro 20, 2005

Mudanças inesperadas

O ano de 2005 revelou algumas metamorfoses inesperadas de ícones responsáveis pelo revivalismo ou redefinição de determinados movimentos.


No caso dos White Stripes a transformação deu-se quase por completo. Não foi desta que puseram de todo de lado o rock garage de forte inpiração nos blues que os caracterizava, mas parecem querer revelar que essa pode ser uma alternativa para o futuro.
Agora explora-se sobretudo a música folk, trazendo-se para a ribalta uma série de novos instrumentos: marimbas, guitarras acústicas, banjos, uma diversidade percussões e um piano ao qual é dado o maior destaque.
Deparamo-nos com uma maior dose de melancolia nas músicas da dupla de Detroit, onde Jack White se mostra mais propenso a revelar os seus dotes de pianista e a confirmar-se como um grande escritor de canções.
“Get Behind Me Satan” revela um grupo que continua a compor música de forma inspirada e apaixonada, capaz de avançar sem receios em direcção às suas heranças musicais, transmutando-as, tornando-as actuais, reinventando assim as tradições da música americana. (8/10)


Os LCD Soundsystem estreiam-se em 2005 no formato de álbum, desta feita homónimo, após três anos de “singles” certeiros, que se tornaram autênticas referências nas culturas urbanas mais “underground”, e que serviram ainda para demonstrar (uma vez mais) a vitalidade que há meio século emerge da cidade de Nova York no que diz respeito ao universo Rock’N’Roll. É justamente a esse universo onde se vai buscar a fonte de inspiração, sem no entanto se limitar a ele, cruzando-o descaradamente e sem receios com linguagens da música electrónica.
O álbum apenas perde um pouco por deixar transparecer em certos momentos a intenção de pretender chegar a um público mais alargado do que aquele até então conquistado, e isso nem constituiria um problema se a composição não se apresentasse forçada nesse sentido. Porém trata-se no geral de um bom disco, capaz de animar entusiasticamente as pistas de dança, e de se tornar numa referência por ajudar a redefinir as linguagens do rock urbano. (7/10)

sábado, novembro 19, 2005

E inovação, não há?!...

Alguns dos lançamentos mais aguardados para o ano de 2005 na área da música podem não ter surpreendido, no entanto parte deles também não desiludiram. Os grupos que se seguem distinguem-se do panorama musical actual por já terem mostrado o seu poder de criação e por continuarem a compor canções eficazes, embora presentemente não se destaquem por terem o carimbo de invenção antes do tempo. Isso porque quando uma fórmula é usada mais do que uma vez corre-se o risco de esgotar o acto criativo – amansar a sua arte – se bem que possa continuar a revelar-se convincente.


O regresso dos Goldfrapp faz-se com “Supernature”, onde uma visita aos dois registos anteriores da banda parece ser evidente. Evoca-se sobretudo o prazer carnal de “Black Cherry”, no entanto os ambientes contemplativos de “Felt Moutain” também se encontram presentes. A voz de Alison continua perturbante, única, agora mais dada à exploração de novos registos do que a devaneios vampíricos. Destaque ainda para a sedutora apresentação do disco. (7/10)


“No Wow” é o título do segundo álbum dos The Kills, que agora se apresentam mais dóceis. Elaboraram um registo menos ruidoso que o anterior “Keep In Your Mean Side”, no entanto a base da composição continua a mesma. Os ambientes continuam a apresentar-se irreverentes, quentes, íntimos e muitas das vezes contagiantes, mas uma certa sujidade e inconformidade parece ter-se ido, e que só lhes ficava bem. (7/10)


Os The Raveonettes exploram em “Pretty In Black” territórios da música folk americana e põem de lado alguma dose de cinismo que prevalecia nos álbuns anteriores, adoptando assim uma luminosidade que até à data não lhes era reconhecível. Encontramos a voz de Sune Rose Wagner mais amadurecida (prometendo que ainda se podem esperar boas surpresas dela) e uma Sharin Foo mais participativa. O registo contém um bom punhado de excitantes canções, sobretudo aquelas que são atravessadas por uma veia psicadélica, se tivessem optado por deixar algumas das restantes fora do lote (arriscando novamente a apresentar um álbum de curta duração) poderíamos estar perante outro registo superior saído das mãos do grupo. (7/10)


A proposta dos Queens Of The Stone Age para suceder o excelente “Songs For The Deaf” dá pelo nome de “Lullabies To Paralyze”. Desengane-se quem se deixa fiar pelo título, aqui o único tema parecido com uma balada é o de abertura do álbum, a partir daí tudo o resto pode paralisar, mas nem sempre deslumbrar. Continua-se a fazer música bem pensada, composta e executada. Neste registo existe uma maior dedicação à exploração de territórios cerebrais, em detrimento dos impulsos do corpo, tornando-se assim tudo mais paranóico e menos pujante. Dá-se a conhecer mais um álbum denso, equilibrado, onde se monstra uma vez mais que sem dúvida se tratam de grandes músicos, liderados por um bom vocalista, mas a quem faltou um pouco de graça na fluidez dos arranjos. (7,5/10)

Aconselha-se a audição dos álbuns anteriormente referidos, até porque se toda a música que por aí se faz tivesse a qualidade desta tanto as rádios como os canais televisivos de música não estariam tão cheios de “lixo industrial”. Porém fica o aviso: são álbuns indispensáveis para os fãs, mas podem não ter o fôlego necessário para convencer os mais cépticos ou para conquistar novo público se não se escolherem “singles” certeiros.

domingo, novembro 06, 2005

THE END AKA THE BEGINNING